Breno direto da FENAVINHO – O salto de qualidade
Breno Raigorodsky, amigo e colaborador de todos os sábnados com suas deliciosas crônicas, nos escreve direto da Fenavinho. Para acessar seus textos anteriores, clique em Crônicas do Breno, aqui do lado, na seção – Categorias
Nesta semana de visitas à região do Vale Vinhedo, sob o patrocínio da Ibravin e por ocasião da Fenavinho, elejo homenagear com este artigo dois sujeitos entre todos que nos acolheram e nos agradaram com seus produtos, e suas personalidades. Um lembra o outro. Idalêncio Angheben lembra Mário Geisse.
Trabalharam juntos em projetos importantes na consolidação da imagem Chandon no Brasil, o primeiro desde o começo – e por muitos e muitos anos – e o segundo ao orientar a criação do momento mais bem sucedido em termos de qualidade da empresa francesa por aqui, em torno do início dos anos 90, incluindo o lançamento do Excelence da Chandon. Pensem que ousadia foi criar um produto que atingiria o mercado com o peso de um preço ao menos duas vezes superior a tudo que ele houvera absorvido até então! O Excelence foi sucesso puro e abriu o caminho para que Garibaldi ganhasse a fama de terra dos espumantes. O Idalêncio colocou seu conhecimento a serviço da Chandon, desde o inicio do processo de implantação da gigante francesa pela América, que, como um polvo atento, estendia seus tentáculos para o Brasil, Argentina e EUA simultaneamente. Idalêncio veio de família vinhateira, mas foi dos primeiros de sua geração a se livrar do rame-rame circular das famílias de antão, que viciava a produção brasileira com álcool indevido, vindo de uvas americanas. Foi pras cabeças, não conciliou sempre que houve brechas para lutar e se locupletou com conhecimentos modernos adquiridos não apenas nas salas de aulas, mas nos campos e bodegas.
O Mario veio para cá quando já tinha dados os primeiros passos no Chile em direção às modernas técnicas que faziam da qualidade o objetivo a ser atingido e não mais – quase tão somente – a quantidade produzida. Por esta razão, a Chandon o cooptou. O chileno ficou por aqui durante alguns anos, foi-se embora para a sua terra para sempre cá voltar, seja como consultor, seja como produtor proprietário de uma das mais charmosas e melhores casas vinícolas do Brasil. Sua especialidade agora, borbulha em garrafas que saem com o nome Casa Amadeu/Cave Geisse as melhores do país (não para mim, não para você, mas para toda a torcida do Corinthians). São borbulhas que nascem neste canto do Vale do Vinhedo, onde Pinot Noir e Chardonnay – na proporção de um para três – brotam das terras que ficam na chamada Linha Amadeo, terra cujo solo rochoso, poroso e com falhas estruturais importantes, permite rápida drenagem. E, com a cumplicidade indispensável de uma amplitude térmica excelente, cria as condições de plantio que procurava.
Sem deixar seu trabalho na Casa Silva chilena, Geisse está sonhando acordado, fazendo parcerias locais para produzir o seu projeto que, não por acaso, chama-se Soño, que é de produzir ele mesmo e em terra própria o que ele mais tem como referência. Ou seja, Mario comprou e produz atualmente champanhe em Champagne, Reims, França. Mario produz carmenèrre no Chile, com marca própria. E pretende fazer muito mais, é só esperar. Em artigo recente para a revista Isto É, o leitor fica sabendo que “um de seus tintos, o Bisquertt, foi eleito em 2002 o melhor merlot do mundo pela International Wine Spirit Competition, na Inglaterra. O mesmo concurso elegeu no ano passado outro de seus “filhos”, o Los Lingues Gran Reserva 2001, o melhor carmenère do planeta”. Mas o que a revista e ninguém mais fala é sua revolucionária decisão de optar por estas caixinhas com torneira para comercializar os vinhos que produz, além dos espumantes, com o nome Casa Amadeo. São vinhos de uvas de vinhateiros da Linha de Amadeo que ele fiscaliza e vinífica criando seus Reservas, um tinto – em caixas de 5 litros – e outro rosado – em caixas de 3 litros. É um projeto que pretende diminuir custos e popularizar o vinho, que pode chegar às taças dos restaurante a menos de R$5,00 com a qualidade Geisse, produto de excelência como já demonstrou com todos os outros que faz.
Mas o Mario continua lembrando o Idalêncio Angheben, depois de tudo isso. Eles se assemelham pela quantidade de coisas que fizeram para o vinho brasileiro ganhar qualidade. Pois não bastasse Idalêncio ter seu nome ligado à história da Chandon, foi ele o principal professor formador desta geração de enólogos que começam a aparecer atrás de todas as vinhas Brasil afora. Não bastasse sua ação acadêmica, foi o técnico explorador que com seu filho Eduardo – doutor em enologia, formado pela primeira turma do Brasil, com especialização em Bordeaux – descobriu para o vinho a Campanha, particularmente a Encruzilhada da Serra, onde mantém sua plantação, muito antes de Lidio Carraro sequer pensar em plantar por lá. Foi ele também responsável pela realização do Vale do Vinhedo, dando condições para que aquela produção passasse do vinho de mesa a vinho fino entrando para uma rota de qualidade. O cara é sério. Fora do meio, seus produtos são conhecidos apenas alguns de seus vinhos de muita qualidade, como estes Gewurtzraminer e Touriga Nacional que tive oportunidade de provar e colocá-los entre as melhores surpresas que experimentei nesta semana (veja abaixo).
Geisse e Angheben. Uma dupla que merece um olhar atento, porque quando parece que eles estão deitando em berço esplêndido, mostram que se levantam, só para surpreender.
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Palmas para um produtor como o Geisse, que decide comercializar seus vinhos tinto e rosado reservas, em caixinhas de papelão, incentivando o mercado para superar a pecha de produto de carregação colados às caixinhas, que não deixam o ar entrar conforme o vinho vai saindo, uma solução ideal para vender vinho em taça em restaurantes de bom movimento.
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Palmas para a Angheben por estes Touriga Nacional e Gewurtzraminer, ambos traduções locais, sem muitas concessões aos modelos europeus.
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Palmas dobradas ao elegante brinde que os jornalistas receberam do Juarez Valduga: uma grappa de chardonnay embalado como se fosse perfume com spray. Ótimo para pulverizar um embutido fatiado ou uma salada ou sei lá o quê, provando que a Valduga atingiu a maturidade em comunicação.
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Palmas para os chardonnay tranqüilos da Guerini, Salton e da Valduga. Competem com outros grandes como os da Cordilheira de Sant’Ana, do Bettù e do Villa Francione. O Valduga tem quase tanta manteiga quanto o da Villa Francione e até arrisco dizer que pode ser mais equilibrado que o prestigiado concorrente. Palmas para os espumantes em geral, o que não é mais surpresa. Surpresa neste quesito é o da Dal Pizzol, finalmente um moscatel que não exagera no açúcar.
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Palmas para o Elo da Lidio Carraro, que usa o malbec em 20% para equilibrar o cabernet sauvignon e fazer do vinho um retorno gastronômico à vocação autóctone em Cahor da uva ícone argentina. Finalmente, nada daquela gosma enjoativa de compota de açúcar que tanto caracteriza o ataque na boca.
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Palmas (?!) para o Series: Cabernet Franc da Salton. Palmas pela qualidade, mas pena pela descontinuidade, pois o produto saiu da linha de produção.
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Palmas para a propriedade do Dal Pizzol. Palmas para a sua adega de vinhos de mais de 30 anos. Palmas por nos conceder uma degustação com um deles, polêmico na avaliação, agradando mais um do que outros.
- Palmas para aqueles que procuram sua identidade porque parece ter chegado a hora de não apenas servir o que se espera, mas surpreender e educar com a qualidade.
Breno Raigorodsky; filósofo, publicitário, sommelier e juiz de vinho internacional FISAR