Trapiche Malbec com Filhote. Onde já se Viu?!
Como no vinho, em que as pessoas tendem a colocar sob suspeita as pseudo “frescuras”, a necessidade de decantar vinhos, das taças adequadas, temperatura, os altos preços, enochatisses, etc. , a gastronomia também tem lá seu séquito de suditos de pouca fé. Na gastronomia as indagações passam por pelas também pseudo “frescuras” dos restaurantes, composições estrambólicas, show bizz, pequenos pratos altos custos, marketing desacerbado de determinados chefs, etc.. As sinergias são tantas que não é à toa que caminham juntos e possuem um nome próprio, Enogastronomia, com tudo o que isso tráz de bom e de preconceito. Na vida, no entanto, valores e conceitos são constantemente colocados em cheque, passando por revisão quando nos deparamos com fatos e experiências concretas. Em Moçambique, uma propaganda de cerveja dizia que “contra fatos não há argumentos e um fato num copo era, ….” pois bem, neste caso foi um fato no prato e outro na taça formando uma harmonia “inargumentável”!
- Momento – uma degustação de vinhos Argentinos da Trapiche.
- Local – restaurante Skye do hotel Unique.
- Chef – Emmanuel Bassoleil
- Vinho – Trapiche Malbec Finca las Palmas 2006
- Prato – Filhote (peixe do Amazonas) “roti” com molho denso de lentilhas com bacon.
Ao primeiro olhar (uma pena que não tenha conseguido uma foto), a previsão de uma verdadeira catástrofe, peixe harmonizado com vinho tinto denso e tânico. Quem teria sido a “mente iluminada” a inventar tamanha aberração?! Após todas as exclamações possíveis misturando incredibilidade e entusiasmo pelo incrível resultado obtido nesta imprevisível, para os mais leigos que nem eu, harmonização de um prato com um vinho. Creio que a primeira harmonização, absolutamente divina, se iniciou pelo peixe com a lentilha e bacon, algo por si só já inusitado e uma composição absolutamente deliciosa. Segundo, a harmonização desse peixe, lembrando que é de rio e conseqüentemente não salgado, com um tinto, Trapiche Malbec Las Palmas, de bom calibre levantando a ambos e levando ao nirvana o degustador que ficou em êxtase perante tanta ousadia e magnífico resultado obtido com uma longa, muito longa persistência. Todo o resto depois desta harmonização ficou em segundo plano, sendo extremamente difícil retomar o senso critico para uma avaliação do que ainda haveria por vir.
Dois maestros em ação; Emmanuel Basoleil, chef premiado e de renome com Daniel Pi, Chief Winemaker da Bodega Trapiche e responsável por alguns néctares produzidos pela casa. A criatividade e genialidade de cada um enaltecida à quinta potência, um almoço inesquecível, uma lição a mais e um enorme privilégio para um pobre marquês, um “gafanhoto”, (quem tiver mais que 30 e algo, certamente lembrará da série Kung Fu) da mesa e do copo perante tão grandes mestres, mas tinha mais.
Sim porque na verdade o tema deste blog, é a degustação dos vinhos principais da Trapiche trazidos pela divisão Classics da Interfoods. Para nos receber, um gostoso espumante Trapiche Extra Brut elaborado com 70% Chardonnay, 20% Semillon e 10% de Malbec pelo processo Charmat. Nariz intenso, muito perfumado (Semillon?), fresco, perlage abundante e fácil de tomar – R$44,00. Para dar inicio aos “trabalhos” um Chardonnay Finca Las Palmas 2007 que passa 9 meses sur lie e apresenta um teor de álcool bastante alto para um vinho branco, 14.5%. Baunilha, coco, manteiga, frutas tropicais, está tudo lá com um final algo doce e de pouca persistência. Um estilo bem marcado pela madeira, possui um preço em torno de R$65,00. O Las Palmas Malbec 2006 que passa 18 meses em barricas de carvalho francês, é um vinho de boa tipicidade com uma bonita cor violeta, muito frutado, mas a madeira sobressai um pouco o que talvez possa ser equacionado com uma decantação maior. Cresceu muito na combinação com o prato (Filhote) fazendo um conjunto muito saboroso, tendo mostrado boa persistência, tendo um preço de mercado sugerido, por volta dos R$65,00.
Viña Federico Villafañe Malbec Single Vineyard 2006, o vinho que mais me entusiasmou neste agradável almoço, tanto por sua riqueza de sabores, como pela relação com seu preço em torno de R$192,00. É um vinho muito harmônico que consegue equilibrar muito bem a potência com a elegância, o que não é muito comum. Vinho muito rico, de boa acidez, grande estrutura, com bom volume, macio com taninos maduros ainda firmes porém aveludados, tendo se sobreposto ao prato (risoto de malbec com rúcula e gorgonzola) que se mostrou demasiado delicado para um vinho de tão forte presença e caráter. Ótima persistência, um vinho de guarda que está bom agora e deverá estar maravilhoso dentro de mais dois, três ou quatro anos. O vinho ícone da Bodega veio a seguir, devidamente acompanhado por um lindo e saborosissímo Medalhão de Filé Migon a Rossini, era o Trapiche Manos 2004, nome alusivo á sua elaboração quase que artesanal. Um baita vinho, mas ainda extremamente novo, potente, álcool sobressaindo um pouco, caldo que precisa de mais alguns anos de garrafa para ser aproveitado em todo o seu esplendor. Com uma produção pequena de apenas 6.000 garrafas, elaborado todo ele manualmente com desengaço das uvas uma a uma em 1/3 do lote num processo em que elimina semente e polpa, deixando somente a casca para aportar maior concentração de cor e tanicidade. Passa 18 meses em barrica de carvalho nova e 24 am garrafa antes de ser colocado no mercado. Possui 15% de álcool e necessita de ao menos uma hora de decanter antes de servir. Se o Viña Federico Villafañe já não é um vinho para qualquer um no quesito preço, este se torna ainda mais seletivo com um preço de R$408,00.
Para finalizar, o Trapiche Chardonnay Tardio 2005, nariz de muita intensidade,abacaxi em calda, mel mostrando-se bem denso na boca e terminando com um açúcar residual algo alto faltando-lhe um pouco de acidez para atingir um maior equilíbrio. Necessita de ser acompanhado com sobremesas de maior acidez. Preço ao redor de R$54.00.
Salute e kanimambo.