A simples menção dessa frase já causa arrepios e quem não me conhece melhor poderia até acreditar que sigo essa corrente machista, muito pelo contrário, mas de qualquer forma creio que consegui o objetivo que era chamar sua atenção, rs, então agora falemos sério. “ O ditado popular, além de politicamente incorreto, é uma falácia. Ninguém em sã consciência, e sintonizado com o mundo, ousaria dizê-lo impunemente, pelo menos nos países ocidentais, ou segui-lo. A Alemanha é comandada por uma mulher assim como Chile, a Argentina e o Brasil entre diversos outros países do mundo. E esta tendência não é apenas na política!” Permitam-me então, prestar-lhes uma homenagem singela no dia de hoje usando as palavras de outro. Sim, quando nos deparamos com um belo texto, mesmo que um pouco longo, como este que mostra a grandeza das mulheres inclusive no mundo do vinho, só temos que reverenciá-lo e lamentar não ter a mesma capacidade. Este texto, com a devida vênia, é de Luiz Gastão Bolonhez, editor de Vinhos da Revista ADEGA e o descobri na internet já há algum tempo, agora descubra como as mulheres estão revolucionando o mundo do vinho com a sensibilidade e elegância que lhes é peculiar.
“Várias áreas econômicas já se renderam aos encantos da mulher. A saia já substitui a gravata em cargos importantes de diversas empresas privadas. No mundo do vinho não é diferente. As mulheres brilham cada vez mais e conquistam o mercado internacional com vinhos que aliam sensibilidade e elegância.
No início de agosto, desembarcou no Brasil a portuguesa Filipa Pato, que seguiu os passos do pai na formação universitária em química e, como ele, deixou o mundo dos átomos para se dedicar ao vinho. Em sua presença, um ditado sempre vem à tona: “Filha de Pato, Patinho é”. O trocadilho é justificado quando se degusta os vinhos produzidos por ela. Seu pai, Luís Pato, é um dos enólogos mais prestigiados de Portugal, com elogios constantes da renomada crítica inglesa Jancis Robinson, mais uma mulher no mundo do vinho. Com formação em Bordeaux e estágios na Argentina, Filipa promete superar o pai. Ela imprime raça e modernidade aos seus vinhos, produzidos em duas tradicionais regiões portuguesas, Dão e Bairrada. Os destaques de Filipa – e das outras enólogas mencionadas na matéria – podem ser conferidos, em destaque, na seção Cave, entre as páginas 72 e 81.
Outra enóloga que passou pelo país, na segunda semana de agosto, foi a elegante Maria Luz Marin, que escolheu para seu primeiro projeto a região chilena do Vale de Leyda, situada no Vale de Santo Antonio, ao sul de Valparaiso. A escolha, por si só, já demonstra a força da intuição feminina. Atualmente a região está entre as duas grandes descobertas vitivinícolas do Chile nos últimos anos, junto com o Vale de Limarí, ao norte. A proximidade com o mar e as brisas marítimas criam condições excepcionais para a plantação de algumas variedades, como a Sauvignon Blanc, a Chardonnay, a Syrah e, principalmente, a Pinot Noir. E adivinhe quem produz, no Chile, os melhores vinhos com essa última variedade? Isso mesmo, a Casa Marin, de Maria Luz.
Se por um lado Filipa representa a juventude e a força de um país que precisa de mudanças, por outro Maria Marin é uma empresária e enóloga que decidiu produzir vinhos de exceção em um dos países que mais cresce na produção de vinhos especiais em todo o planeta. Mas os exemplos não param por aí. A encantadora Madame May Eliane de Lencquesaing, proprietária do maravilhoso Chateau Pichon Longueville Comtesse de Lalande, é a única mulher – proprietária e produtora de vinhos – que ostenta o título de Men of the Year, da revista inglesa Decanter. Sua história é impressionante. Ela foi casada com um general francês e fez parte da resistência francesa durante a Segunda Guerra Mundial.
As deliciosas histórias de May Eliane, que teve seu Chateau invadido pelos nazistas durante o conflito, se encontram no livro Vinho e Guerra do Casal Kladstrup (Jorge Zahar, R$ 36). A paixão de Madame May Eliane por seus vinhos encanta qualquer apreciador de vinho… e de história. Na última vez que estive com ela, discutimos os preços exorbitantes da safra 2000. Com muito jeito e elegância, ela me disse, quase aos sussurros: “Fique tranqüilo, pois nosso 2001 é tão espetacular quanto o 2000”. Tive o privilégio de provar esse vinho que, mesmo jovem, já mostrava seu potencial. No início de agosto, por causa desta matéria, tive o prazer de degustálo novamente. A sinceridade e a dica de Madame May Eliane me tocaram. Estamos diante de um vinho espetacular. Outra dica de Madame May é sempre comprar os deuxième vins (segundo vinho) de grandes produtores.
Ainda em Bordeaux, uma mulher empresta a sua imagem a um dos vinhos mais emblemáticos do mundo, o “Chateau Mouton Rothschild”. A Baronesa Philippine de Rothschild é filha do lendário Baron Philipe, um dos maiores ícones do mundo do vinho. A história que Philippine traz da Segunda Guerra Mundial é mais dramática do que a de Madame May. Capturada pelos nazistas, sua mãe faleceu em Ravensbruck, em 1945. Philippine herdou do pai a personalidade excêntrica e conseguiu manter o prestígio do “Chateau Mouton Rothschild” após a morte do barão, em 1988. Falar desse vinho é “chover no molhado”.
Além do Mouton, ela produz na mesma região os prestigiados “D’Armailhac”, ex-Chateau Baronne Philippe, e “Clerc Milon”, que está entre os vinhos de melhor custo benefício de Bordeaux. Ela também possui um belíssimo empreendimento no sul da França (Languedoc, Roussillon), onde produz vinhos muito interessantes em parceria com produtores locais. Tudo isso sem contar o ordinário e famoso “Mouton Cadet”, o vinho de volume da marca. Além de produzir bons vinhos, o projeto do sul da Franca tem caráter social de destaque internacional. A baronesa vende barricas de 250 litros e engarrafa os vinhos com o nome do proprietário. O valor arrecadado da venda das barricas é doado para projetos sociais. Não bastasse o desafio em seu próprio país, a baronesa deu seqüência ao projeto franco-americano de seu pai no famoso e contestado Opus One, na Califórnia, em parceria com Robert Mondavi, e no suntuoso projeto Almaviva, no Chile, em parceria com a família Guilisasti da Concha y Toro.
A elegante Hélène Garcin-Lévêque é outra francesa a figurar no rol das mulheres do vinho. Com formação em Gestão de Hotelaria, em Lyon, ela herdou de sua mãe o Chateau Haut Bergey, em Pessac, e expandiu o negócio com outras aquisições: Chateau Branon, também em Pessac, Clos L´Eglise, em Pomerol, e Chateau Barde Haut, em Saint Emilion. Casada com o viticultor Patrice Lévêque, Hélène é a imagem da nova era de mulheres do vinho na França. Sem dúvida, uma grande candidata à sucessora de Madame May Eliane. O que mais impressiona é que seus vinhos parecem estar em um cosmos, pois eles se complementam e nunca competem. O “Clos L’Eglise 1998”, primeira safra de sua gestão, já mostrou muita diferença. Esse vinho está entre os mais prestigiados do Pomerol, fazendo sombra a clássicos como “Petrus” e “L´Evangile”. O “Barde-Haut” mostra o que se pode esperar de um Saint Emilion moderno. Nessa propriedade, Hélène segue os passos do garage wine Valandraud, atualmente uma das maiores sensações de Saint Emilion. Em todos esses vinhos, Hélène tem a consultoria do competente e controverso enólogo Michel Rolland. Mas, como a conterrânea Baronesa Philippine de Rothschild, Hélène investiu talento fora do país. Na Argentina, ela montou um projeto visionário chamado Poesia e conseguiu produzir um vinho de terroir com o mesmo estilo de seus Grand Crus franceses.
Sem deixar a Argentina, encontramos outra mulher que faz diferença no mundo do vinho. Durante 30 anos, Alicia Arizu e o marido Alberto, da família proprietária da grande vinícola Argentina Luigi Bosca, estudaram e praticaram, em um projeto experimental, a micro-vinificação e o envelhecimento de diversas castas provenientes de vinhas muito antigas, nas cercanias de Luján de Cuyo. O objetivo do trabalho era elaborar vinhos especiais e suntuosos que colocassem o terroir acima da tecnologia, e a qualidade, acima da quantidade. Desse trabalho nasceu a Viña Alicia, em 1998, comandada pela própria Alicia. Tratase de uma vinícola pequena responsável por vinhos de expressão também chamados de cult wines. São quatro varietais e dois cortes reconhecidos no mundo inteiro. O “Nebbiolo 2003” foi considerado por Michael Franz, do Washington Post, o melhor vinho dessa casta produzido fora da Itália. Mais um ponto para as mulheres.
Se o poeta Vinícius de Moraes tivesse conhecido a portuguesa Sandra Tavares da Silva Borges, certamente elogiaria os dotes da terra de Fernando Pessoa e repetiria a célebre frase: “Desculpem-me as feias, mas mulher tem que ser bonita”. Sem dúvida, Sandra pode ser aclamada como a mais bela enóloga do mundo, mas não foi a partir de sua beleza que ela conquistou um mundo masculino. O Quinta do Vale D. Maria 2001, produzido no Douro, foi o grande campeão de uma degustação realizada há três anos em Portugal, batendo ícones como o já citado “Mouton Rothschild” e o badalado espanhol “Vega Sicília”. Além de tintos e brancos, Sandra também produz um belo e poderoso Porto Vintage (a safra 2002 está comentada em Cave).
Na Itália, duas mulheres tiram o fôlego de qualquer um. Visitar a Cantina Braida, na lindíssima cidade de Rocchetta Tanaro, no Piemonte, acompanhado por Raffaela Bologna, é equivalente a correr 10 mil metros. Poucas vezes pude estar ao lado de uma mulher com tanto vigor, determinação e técnica. Nenhum detalhe técnico escapa de Raffaela. A exemplo da Baronesa Philippine de Rothschild, ela traz o vinho no sangue. Falecido há mais de uma década, seu pai, Giacomo Bologna, inventou a Barbera Barricata (foi pioneiro ao colocar vinhos dessa uva em pequenas barricas de carvalho francês), e a inseriu no cenário internacional com seu “Bricco dell Uccelone”. Como Filipa Pato, Raffaela imprime sua personalidade aos vinhos Braida e conquista novos apaixonados pelo seu estilo.
A conterrânea Elisabeta Foradori não é tão intensa como Raffaela nos seus gestos ou palavras, mas na produção de vinhos, nas Dolomitas, leva muitos a compreender as maravilhas do que pode ser realizado quando o amor é um dos ingredientes envolvidos. Atualmente Elizabeta está entre as mulheres mais importantes da Itália. A cada ano seu vinho ganha mais prestígio. A uva que reina no coração de Elizabeta é a fabulosa Teroldego, variedade autóctone da região do Trentino. Seguramente o mais prestigiado vinho dessa região é o seu “Granato”. Apesar disso, seu vinho base, o “Teroldego Foradori”, pode ser considerado um excelente best buy. Em breve, estarão no mercado os vinhos do novo empreendimento de Elisabeta na Toscana.
Diante dessas nove mulheres – e de seus maravilhosos vinhos – o machismo cai por terra. Desprestigiadas durante milênios no universo de Baco, elas provam que atrás de um grande rótulo também existe uma grande mulher (só para abusar mais um pouco dos ditados populares). Com sensibilidade e elegância, encantam o paladar masculino de modo inigualável. Um brinde ao estilo dessas mulheres notáveis. E das muitas que ainda surgirão nas adegas.”
Como estas nove que o Gastão cita acima, pequeno número perto do grande número de mulheres que engrandecem nossa Vinosfera, inúmeras ganham destaque nos mais diversos cantos do mundo fazendo diferença e deixando marcas por onde passam. Na Itália, país de forte influência machista, existe desde 1988 a associação Le Donne del Vino que reúne mulheres envolvidas em todos os aspectos profissionais do vinho sejam como traders, sommeliers, vinicultoras, enólogas, etc.. Obviamente que este dia significa muito mais, e já escrevi aqui sobre isso em outros dias 8 de Março, mas hoje, inspirado pelo texto do Gastão, optei por ressaltar o papel da mulher em nossa Vinosfera, kanimambo a todas! No entanto, meu salute e kanimambo muito especiais vão para as mulheres da minha vida e às Enoladies que uma vez por mês enobrecem o recinto da Vino & Sapore.
Beijo grande e felicidades no dia de hoje e sempre. Hoje é meu dia de ir para a cozinha, nos outros alternamos, e preparar algo especial. Não sou grande mestre cuca, mas meu fettucine com salmão e espinafre fresco é da hora! Rs
ps. os quadros são de Jamie Adams e o clipboard de uma séire intitulada Women & Wine de Kathy Womack