Hoje optei por falar de prazer, mais do que falar de vinho em si o que voltarei a fazer mais ao longo da semana. Acordei com vontade de filosofar, de falar de prazer no vinho, algo que há muito andava ensaiando depois que um amigo (não muito chegado nos caldos de Baco) me disse que para curtir um bom vinho, bastava despejar o caldo no copo e virá-lo! Pode? Sim, pode até ser num primeiro instante, mas na verdade é uma mera “rapidinha” de duração curta sem maiores impactos sensoriais deixando-se de aproveitar a grande maioria dos pequenos detalhes que completam o todo e fazem a diferença entre o mero gozo e o real prazer.
Apreciar um bom vinho é como lentamente nos desnudarmos perante nossos parceiros passando por toda a fase de nos perdermos nos olhos um do outro, sentindo seu perfume, descobrindo todas as suas nuances e curvas, se inebriando de paixão até se deixar levar ao infinito numa viagem que deixa marcas na memória e nos faz querer mais e mais! Um bom vinho possui uma certa dose de sensualidade, de fogo e paixão que na dose certa gera enorme prazer e pede compartilhamento, uma garrafa a dois é muito mais gostoso, ou não?! rs Complicado?Não, o segredo é querer aproveitar o momento e descobrir toda a complexidade e nuances do vinho num processo de entrega e de cumplicidade muito similar há que podemos usufruir num relacionamento entre duas pessoas, guardadas as devidas proporções obviamente!
Para o tomador de vinho, todos já fomos, qualquer coisa está bom já para o apreciador de vinho há a necessidade de “foreplay”, de prestar atenção, de um certo flerte que fará do processo da descoberta um verdadeiro elixir de prazer. O vinho não é, portanto, paixão de pouca dura e sim um processo continuo de aprendizado e conhecimento em que, como nos relacionamentos, existem momentos de grande euforia advindos da perfeita harmonia encontrada numa taça em um determinado momento e outros nem tanto. Tentar desassociar a técnica da emoção é, neste caso, um exercício em vão, pelo menos em minha opinião já que acredito que o vinhos e o amor nos fazem um pouco mais poetas!
Para tomadores de cerveja estupidamente gelada (ótima forma de esconder os defeitos de qualquer bebida) que juntam garrafas sobre a mesa numa Sexta-feira á noite como se troféus colecionassem ou os que bebem para meramente se embriagarem, tudo o que aqui escrevo hoje certamente se tratará de pura bobagem e devaneios mil (também não devem nem ler este blog), mas os que buscam na taça, e na vida, aquele algo mais, esses certamente entenderão o que estou tentando compartilhar hoje ou, pelo menos assim espero!
Muitas vezes escrevo sob enorme influência do prazer e emoções (as vezes em que mais prazer me dá escrever) e quanto maior a satisfação, maior são os adjetivos usados no intuito de repassar aos amigos leitores as sensações vividas. Aliás, como já mencionei aqui em outras oportunidades, um vinho sem adjetivos é um vinho sem alma, sem encantamento, como aquela transa fugaz que pode até resultar num relaxamento momentâneo, porém normalmente deixa para trás aquela sensação de que faltou algo!
Achar que as análises e comentários sobre vinhos são meramente técnicas, é de grande ingenuidade, pois apesar do treino, do estudo e da litragem do degustador eventualmente envolvido, não existe como não nos deixarmos levar pela paixão frente ao prazer e satisfação promovido por um grande vinho (Robert Parker e Bordeaux não me deixam mentir) ou grande momento enogastronomico. Não importa se é com um sanduba de mortadela e um lambrusco, um grande espumante num momento de celebração único ou um jantar de perfeita harmonização entre; o momento, as pessoas envolvidas, o local, o prato e o vinho.
Já dizia o saudoso amigo e mentor, Saul Galvão, num artigo escrito há cerca de dois anos; “quando se fala em vinhos, NUNCA há uma palavra final, mas sim opiniões, que podem ou não ser bem sustentadas. O vinho só existe para dar prazer. Se ele deu prazer, cumpriu sua função, independentemente de regras cânones e opiniões alheias”
Separar o doce néctar de seu viés emotivo é, nesse sentido, algo totalmente equivocado em minha opinião. Tudo na vida é um processo de evolução e depende de cada um determinar seus objetivos. Existe um inicio, nem sempre muito positivo, que vai ganhando qualidade conforme vamos obtendo maior experiência o que, em nossa vinosfera, conhecemos como litragem. Experimentar, buscar diversidade, variar saindo da mesmice, tudo contribui para que o nirvana que se busca seja alcançado. A diferença maior jaz no fato que enquanto num relacionamento a dois a fidelidade é essencial, em nossa vinosfera a infidelidade faz parte do processo de crescimento e aprendizado, prove muito, prove de tudo, aventure-se e deixa a taça te levar a lugares e culturas diferentes sem, no entanto, deixar de ter seu porto seguro!
Cá entre nós, só nota de vinho e os mesmos aromas de frutos de vermelhos e complexidade de boca, tem hora que enche, não?! Até eu volta e meia me vejo nessa! Enfim, por hoje chega, já viajei demais, rs. Cheers, saúde, kanimambo e parafraseando o poeta popular Zeca Pagodinho:
Eu já passei por quase tudo nessa vida
Em matéria de guarida
Espero ainda a minha vez
Confesso que sou de origem pobre
Mas meu coração é nobre
Foi assim que Deus me fez
E deixa o VINHO me levar….